Legislação estadual que instituiu serviço voluntário de policiais civis aposentados prevê pagamento fixo e até 13º salário, enquanto vagas de peritos criminais continuam sem preenchimento por meio de concurso público
Em representação protocolada nesta quarta-feira (19), o Ministério Público de Contas (MPC) pede a concessão de medida cautelar para determinar à Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) a suspensão imediata dos atos de designação dos servidores policiais civis aposentados, por meio do Serviço Voluntário de Interesse Policial (SVIP), e a adoção de providências para que as tarefas atribuídas a eles sejam desempenhadas exclusivamente por servidores públicos concursados.
A representação do MPC aponta graves ilegalidades na aplicação da Lei Complementar Estadual 850/2017, a qual admitiu forma de provimento no serviço público fora das hipóteses previstas na Constituição Federal, com burla ao concurso público.
O MPC destaca que essa lei instituiu, no âmbito do Estado do Espírito Santo, o Serviço Voluntário de Interesse Policial, para realização de atribuições específicas, a serem desenvolvidas por policial civil aposentado em jornada semanal de 40 horas. A prestação de serviço voluntário tem por objetivo permitir o aproveitamento técnico e qualificado de policiais civis que já se encontram aposentados, no exercício de tarefas de natureza eminentemente técnico-administrativa, compreendendo o atendimento ao público, o preenchimento de formulários diversos, a condução de veículos policiais automotores.
O objetivo da Polícia Civil ao utilizar-se da lei era minimizar os efeitos da carência de peritos oficiais criminais. Em junho e setembro deste ano foram divulgados o resultado final da avaliação das inscrições do processo de contratação dos servidores policiais civis aposentados considerados aptos para os cargos não só de Perito Oficial Criminal, mas também de Investigador de Polícia, Agente de Polícia e Escrivão de Polícia.
Apesar de a lei tratar de serviço voluntário, o órgão ministerial ressalta que dispositivos da norma trazem a “previsão de ajuda de custo mensal, vale-transporte, custeio de uniforme e férias remuneradas com adicional de um terço da retribuição financeira e abono natalino, o que descaracterizaria o serviço voluntário”.
Para o MPC, a legislação criada no Espírito Santo afronta a Lei Federal 9.608/1998, que dispõe sobre o serviço voluntário, pois embora possa haver ressarcimento pelas despesas que comprovadamente realizar no desempenho das atividades voluntárias, não é possível admitir o pagamento de valor fixo e mensal, ainda mais abono natalino (13º salário).
“Deste modo, resta vislumbrado que a roupagem utilizada pela legislação estadual, sob a alcunha de serviço voluntário, não encontra guarida na Constituição Federal que é expressa ao determinar a exigência de prévio concurso público como regra para ingresso no serviço público”, destaca o MPC na representação.
O órgão ministerial aponta, ainda, o “completo desinteresse no preenchimento dos cargos vagos de perito oficial criminal, que atualmente é de 277, inexistindo justificativas para autorização de concurso público com disponibilização de somente 50 vagas para perito oficial criminal, enquanto são contratados indevidamente servidores policiais civis aposentados para o desempenho destas atividades”.
Em razão das irregularidades apontadas, o MPC pede que seja concedida medida cautelar para suspender a designação de servidores aposentados, sem prévia aprovação de concurso público, para desempenharem atividades típicas de cargos de provimento efetivo. No mérito, o MPC pede que seja instaurado incidente de inconstitucionalidade quanto a diversos dispositivos da Lei Complementar 850/2017 que contrariam a Constituição Federal e, ao final, seja declarada a nulidade de todas as designações de servidores policiais civis aposentados, fundadas na LC 850/2017, determinando às autoridades competentes que tal tarefa seja atribuída aos servidores públicos de carreira, aprovados previamente em concurso público, além da aplicação de multa aos responsáveis.
A representação do MPC tramita no Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) sob o número TC 9808/2018 e está sob a relatoria do conselheiro Rodrigo Coelho do Carmo.