Ao acatar parcialmente recurso interposto pelo Ministério Público de Contas (MPC), o Plenário do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) reconheceu a ocorrência de diversas irregularidades na Prefeitura de Presidente Kennedy, no exercício de 2013, e que os servidores públicos da área de assistência social, cujas atribuições são técnicas e de necessidade permanente, devem ter cargos de provimento efetivo, ocupados mediante a aprovação em concurso público.
A decisão, publicada nesta segunda-feira (24) no Diário Oficial de Contas, também determina que o município realize concurso público no prazo de um ano após o término da pandemia e reforça não ser possível o município utilizar recurso dos royalties do petróleo para o pagamento de prestação de serviços permanentes e ordinários, como ocorreu em Presidente Kennedy, onde a prefeitura efetuou o pagamento dos salários de servidores da assistência social com recursos dos royalties do petróleo.
Essa foi uma das irregularidades apontadas pelo MPC e reconhecidas pelo relator do recurso (Processo 20556/2019), conselheiro Rodrigo Coelho. Ele acatou os argumentos do MPC de que os valores dos royalties do petróleo não foram empregados para pagamento de salários de servidores temporários, em consonância com a Lei Federal 7.990/1989, que veda tão somente, o pagamento de servidores do quadro permanente. Isso porque, conforme esclareceu o recurso ministerial, os servidores temporariamente contratados desempenharam funções de servidores efetivos por anos consecutivos, prática que a equipe técnica denominou transfigurar “o caráter de necessidade temporária” dessas contratações, contrariando normas constitucionais e infraconstitucionais.
Em seu voto, o relator destacou que como “os serviços da Assistência Social visam à garantia dos direitos daqueles que se encontram em situações de vulnerabilidade e risco social, devem ser de forma continuada, permanente e planejada”. Tendo isso em vista, ele acrescentou que “diante do fluxo de contratações temporárias, demissões e recontratações, notadamente, por estas contratações representarem importante poder eleitoral para os gestores, é que se verifica o enorme prejuízo para a consecução do desenvolvimento da política pública assistencial, em razão da ruptura da continuidade dos serviços realizados”.
O relator apontou também que a ausência de uma composição, ainda que mínima, de servidores efetivos na Secretaria de Assistência Social, afronta a orientação da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o qual é composto pelo Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).
Com isso, concluiu-se que os servidores públicos que compõem a estrutura organizacional das unidades de referência do SUAS, cujas atribuições são técnicas e de necessidade permanente, devem ter cargos de provimento efetivo, ocupados mediante a aprovação em concurso público. O relator fez ressalva às hipóteses de nomeações para cargo em comissão e às contratações temporárias, as quais devem ser de necessidade temporária de excepcional interesse público, conforme previsto na Constituição Federal. Outra possibilidade é a de terceirização dos serviços públicos, que podem ser admitidas em casos de atividades de caráter secundário e transitório.
Contratações temporárias
Outra irregularidade apontada pelo MPC e reconhecida pelo TCE-ES no julgamento do recurso foi a contratação de servidores temporários sem demonstração da real necessidade temporária de interesse público. Essas contratações ocorreram com base nas leis municipais 1.073/2013, 1.079/2013 e 1.080/2013 para as áreas da educação, saúde e assistência social, respectivamente, de forma irregular, conforme ressaltou o MPC, em razão da indeterminação do prazo para contratação e por não evidenciar a necessidade temporária de interesse público excepcional.
Ao reconhecer como fato incontestável que as referidas nomeações deveriam ter sido exercidas em cargos efetivos, após a realização de concurso, conforme determina a Constituição Federal, o Tribunal de Contas decidiu negar a aplicação das leis acima citadas pelo município por afrontarem os mandamentos constitucionais e, por consequência, determinou que a regularização do concurso público pelo município se dê um ano após a decretação do fim da pandemia.
Ao final, a Corte de Contas deu provimento parcial ao recurso do Ministério Público de Contas para manter, além das duas irregularidades citadas, outras quatro, sob responsabilidade da ex-prefeita de Presidente Kennedy Amanda Quinta Rangel e diversos servidores municipais: estabelecimento de exigência excessiva e não razoável em edital de licitação, causando restrição ao seu caráter competitivo; opção pela despesa com a locação de veículos sem prévio estudo da viabilidade econômico-financeira da locação em relação à aquisição dos bens ou outra forma de contratação disponível no mercado; estabelecimento de exigência indevida para qualificação técnica do licitante, causando restrição ao seu caráter competitivo; e do estabelecimento de critério desprovido de razoabilidade para consideração da inexequibilidade da proposta em edital de licitação, acarretando na desclassificação da proposta mais vantajosa para a administração.
Por levar em consideração que o município havia acabado de passar por uma intervenção estadual quando da ocorrência dos fatos verificados na auditoria e devido aos esclarecimentos trazidos pelos gestores quanto à imperiosa necessidade de continuidade dos serviços assistenciais, o TCE-ES decidiu não aplicar multa aos responsáveis. A decisão também afastou a irregularidade relativa ao pagamento por serviços não prestados na execução de contrato de locação de caminhão-pipa, bem como o ressarcimento apontado pelo MPC.
Processo 20556/2019Leia mais
15/01/2020 – Recurso: MPC pede condenação de prefeita de Presidente Kennedy, servidores e empresa por irregularidades em contratos e pagamentos